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10 dezembro, 2005

Entre a Vida e Morte - 1º Parte


Nunca falei deste assunto a ninguém, talvez não sentisse a grande necessidade de tocar esta memória desabrochada e lancinante aos nove anos, meses antes de a minha irmã nascer.
Quase todos os adultos, pensam que as crianças não tem a percepção da realidade quando se fala sobre a vida e a morte, o que é normal por natureza.
Eu senti a morte de perto, por mais irónico seja não era eu que estava num fio de navalha, mas o meu avó que lutava desesperadamente pela vida.
Recordo-me nitidamente, era uma manhã graciosa embalada com o andamento musical das próteses auditivas que captavam para dentro dos meus canais sonoros, enquanto caminhava em passos pequenos, olhei para a claridade da luz que batia em todas as cores no céu, como um simples arco-íris.
Via as pessoas acenarem para mim, cumprimentado os meus pais e minutos mais tarde entramos para dentro do carro, onde me iam levar à escola.
Sentada no banco de trás, de cara colada no vidro, os meus olhos brilhavam com a instância de distinguir todas as simetrias resultantes das linhas que via nos carros em andamento moderado, nos edifícios degradados e novos.
Mais adiante, deparava com um muro estreito e comprido que passava ao lado do reflexo vidrado e húmido do meu ar que manchava, a Quinta do Álamo com espaços verdes, este mesmo local aparenta ter duas facetas secretas e ao mesmo tempo era assustador de noite, ninguém se atrevia entrar ai dentro até mesmo os mais crescidos, sob o risco de perderem no caminho.
Delirante, com a felicidade a fervilhar o meu coração, dirigi-me para a escola de sorriso maroto e pegar nos livros como se fossem meus melhores amigos.
As horas passavam, não apercebia dos ponteiros sincronizados e continuava a divertir imenso na aula plástica, desenhando e pintando cores coloridas nas folhas.
A porta da sala abre lentamente, interrogo-me -“quem será?” e fico surpreendida com o que vejo, digo sorridente -“o que os meus pais estão a fazer aqui?”.
Olham para mim e noto que os seus olhos inspiram tristezas, ao fim de dialogar, a professora vem ter comigo e pede que arrume a mochila e vá ter com eles, despede-me com um beijo na testa.
Fiquei empolgada pela presença, desconfiada e receosa pelo aparecimento repentino dos meus pais, com calma perguntei:

M - Vieram buscar-me mais cedo?
Mãe - Filha, eu e o pai queremos dizer-te uma coisa.
Mãe - O avô está no hospital.
M - Qual avô? Ele está bem? (chocada)
Mãe - O avô José, ainda não sabemos amor. (aflita)

Visivelmente abatida, fiz muita força para não chorar compulsivamente e foi inevitável que deixei escapar as lágrimas a escorrerem no meu rosto de criança como um rio continuando, limpei a minha face e me mantive passível no silêncio, aquele silêncio que mais detesto, o silêncio de sofrimento.
As emoções começavam a formar os espaços vazios, a reconstruir uma porção das sensações que estava a sentir naquele pedaço desconhecido chamado dor.

19 comentários:

Isabel Filipe disse...

Há sempre uma 1ª vez para sentirmos a dor ... na minha opinião no teu caso...foi cedo demais...
....mas vou ficar à espera da continuação, para saber como reagiste...

tem um domingo feliz.

beijinhos

pecado original disse...

emocionante continuas a tocar agora com uma historia real e fascinante.
Realmente existem momentos inesqueciveis que nos fazem crescer interiormente.

Obrigado pelas tuas aparições,
Psique e Eros

Fragmentos Betty Martins disse...

Por vezes minha querida. Chega até nós imagens vindas de uma "força superior" que muito pouco sabemos "dela" mas que nos "ronda" a toda a hora. Momentos de premonição que nos fazem viver a dor antes até, de acontecer. Pode haver várias formas de entender - alertar os teus sentidos - preparação para a dor que se aproxima. Este é um
"domínio" do desconhecido.

Desejo que consigas ultrapassar estas emoções.

Fica Bem :)

Beijinhos

Isabel Filipe disse...

Oi Memorex,

Quando quiseres, terei todo o gosto em fazer aquilo que sugeriste...envia o que quiseres para o meu email: filipe.isabel@gmail.com

Beijokas

Anónimo disse...

Fantástico, continuo a adorar ler isto. Lições de vida aprendem-se aqui e é sempre um prazer.

Beijinho,
Psique é Eros

Anónimo disse...

Hoje tirei um tempinho especial para te ler. Uhm! Que luxo! Brinco, menina, brinco. :-)
Gostei de ler as tuas recordações dos 9 anos e de um momento delicado. Eu sinto que me é bom recordar situações do passado, mesmo - ou sobretudo?- quando me foram particularmente difíceis. Como não sou muito de 'desabafar', fico melhor quando consigo escrever sobre elas. A distância temporal, regra geral, ajuda, porém é o acto da reflexão escrita que mais me ajuda a ver claro, a superar.
Ui! Já escrevi tanto e ainda me falta agradecer as tuas sempre simpáticas e carinhosas visitas ao meu azulão. Grata, Memorex. Beijão.
P.S. - fico feliz por gostares de algumas das fotografias da eli. Só há muito pouco tempo ela deixou de ter o pudor de as mostrar 'urbi et orbe'.

Anónimo disse...

Nunca mais esquecemos os que nos deixam, não é? O teu avô, qualquer que seja o lugar em que se encontre, deve estar contente por o lembrares deste modo tão afectuoso.

Anónimo disse...

Acabei de te enviar email.

Abraço grande, grande. Força!

Anónimo disse...

No meu http://engracada.multiply.com está um feliz Natal para ti=)
Estou óptima e tu?
Espero que estejas também óptima.
Portaste-te bem???? Então vais ter muitos presentes.
Jinhos e fica bem!!!
BoM aNo NoVo=)

Anónimo disse...

No meu multiply deixei um cartão de Natal.
Vai lá lê-lo!

FELIZ ANO NOVO!!!!

Beijinhos

Anónimo disse...

Que se passará com a tua caixa de correio?!
Há um especial beijo à tua espera no meu azul.

:=)

wind disse...

Texto emocionante.

Anónimo disse...

Memorex, quero desejar-te FELIZ NATAL e BOM ANO NOVO!!!

(no meu multiply há um cartão para todos os amigos...)

Beijinhos da Andreia.

Anónimo disse...

Olá Memorex,estás boa?
Vim desejar-te um Natal em harmonia e Feliz Ano Novo de 2006...
Espero que tenhas mais presentes do que no ano passado...e que sejas feliz com a tua família e o teu amor!
Muitos beijinhos da amiga Carolina =)

Fragmentos Betty Martins disse...

Querida Memorex

Mil cores no teu olhar...

QUERO DESEJAR

UMAS FESTAS FELIZES

COM MUITO AMOR, SAÚDE E MUITA PAZ

Beijos c/amizade

Poesia Portuguesa disse...

As emoções e a sensibilidade do nosso coração.

Passei para te deixar um grande abraço e votos de um Feliz e Santo Natal

Menina Marota disse...

Junto-me às palavras da poesia e deixo-te um grande abraço e votos de um FELIZ NATAL

SilenceBox disse...

Querida Memorex,
Ao ler o teu texto,senti dor nas tuas palavras... Fiquei emocionada! Nunca se esquece da primeira dor, fica para sempre marcada dentro de nós!
Um forte abraço cheio de carinho para ti, sol_coração!
P.S. - Irei escrever-te um e-mail... Fica atenta aos correios ;-)

Anónimo disse...

M., não posso deixar de estar apreensiva. Desculparás se houver algum egoismo da minha parte, mas gostaria de saber como estás.
Beijinho.